quinta-feira, 27 de novembro de 2014

Pessoas Em Cinzas

"Burn Burn
I wanna watch you Burn
Burn burn
I wanna watch you Burn" (Papa Roach - Burn)






Volto a digitar em plena madrugada, parece que ela adora me atrair intensamente. Não que eu não goste, é a única hora que me sinto livre de verdade. Às vezes me pego pensando se a liberdade que eu sonhava quando era mais novo é a mesma que consegui hoje. Acho que não. Se eu pudesse hoje, eu tentaria espalhar um dilúvio por toda essa terra, por todas essas calçadas sujas de dor e lixo. Todos nós sabemos o quanto foi difícil chegar aqui, não foi? Não estou falando de modo individual, cada um morreu pelo menos uma vez na vida, feridas carregadas na alma como se fosse uma grande mochila.


Imagino como se eu fosse um grande alpinista. Seguro minhas mãos perante as pedras, e me elevo ao grande topo, o espetacular final, como se fosse uma grande peça de teatro. Eu busco incansavelmente essa coisa chamada fim, está frio demais, está difícil demais, cada vez mais vai se tornando inclinado e fazendo com que meus pés retorçam de tanta dor. Meus olhos se entorpecem, minha mão se esquece de segurar a sua. Droga, acabei te deixando pra trás. Bom, talvez você não queira tanto esse final quanto eu. Foi apenas eu quem acabou buscando tudo, foi apenas eu que carreguei as armaduras e todas as ataduras. Mas você acabou usando a armadura, e não se feriu. Apenas eu, fiquei com minhas ataduras.


E minhas comparações aos gladiadores de antigamente se tornam frequentes. Por que adoramos observar pessoas se matando, se machucando, e ainda temos que torcer pra algum dos lados? Estou incrivelmente decepcionado com o resto do meu mundo. Me tornei um desses gladiadores, para provar que estão errados. Eu vou provar que não é preciso matar ninguém, não é preciso ferir ninguém para se divertir. Estou errado novamente. Ninguém vai se sentir a vontade com isso e muito menos me apoiar. Pois afinal, o que as pessoas procuram são litros e mais litros de sangue e lágrimas, o que elas desejam é ver alguém chorar.


Busco novamente o céu como meu objetivo final. Felizes são os anjos que podem voar suavemente perante estrelas e brincar com elas, que podem esquecer da terra um pouco e lembrar como é incrivelmente vasto a imensidão do universo. E, como dizem os poetas e filósofos, o universo conspira a nosso favor. Não sei de onde. Não estou vendo ele conspirar, e se estiver por algum acaso, está conspirando contra mim. É meio difícil aceitar as coisas, mas veja, estou tentando. Estou lutando, com toda a força que tenho. Queria pelo menos que percebessem que eu mudei, mas acho que está tudo bem eu continuar com isso.


Minhas palavras se tornam aleatórias no meio da multidão. Questiono todo esse esforço que faço pra sair vivo daqui, deste sanatório. Mas que droga, me sinto como se estivesse usando uma camisa de força, sendo tratado desumanamente por todas as pessoas ao meu redor, e tudo isso estivesse ocorrendo num navio, para que eu cada vez mais me sentisse enjoado. Meu Deus, talvez se eu me atirasse de um prédio do oitavo andar ainda não chegaria perto da fratura que tenho, cheio de sequelas de lembranças e lágrimas. Como eu supostamente iria lhe dizer que eu ainda sua falta, que eu ainda não me acostumei com as coisas? Chega a ser ridículo essa minha cena.


O que dói mais não é ter saudade, é saber que eu sou um idiota por ainda lembrar de você. Ah, caramba, da próxima vez eu vou é me afastar ao invés de aproximar as pessoas. Essas correntes que me prendem a elas tem pregos que me perfuram, e eu não paro de sangrar. E pensar que um dia eu sabia o que era sorrir, sabia o que era se sentir vivo. Faz tanto tempo. E aqueles meus desenhos, aqueles rabiscos que fiz só pra nós dois, droga, era importante para mim. Bom, isso não foi o suficiente pra você ficar. Está tudo bem. Estou meio melancólico hoje, lembrar você não me faz bem. Mas acho que posso me acostumar com isso, se já me acostumei com tanta idas e vindas, por que não faria o mesmo com a sua ida?


Podem me condenar por ainda lembrar, podem me culpar por me machucar desse jeito. Meu coração se engana todo dia, pensando que vai bater de novo. Eu me recuso a fazê-lo trabalhar. Todas as que passaram por aqui, disseram adeus da pior maneira possível, fazendo com que pouco a pouco, ele derretesse. Agora ele é apenas líquido. Pior, nem isso. Existe apenas um buraco, fundo e escuro onde ele estava antes. É meio ruim se sentir vazio, mas talvez o vazio não me deixe sozinho. E eu vou só, entre ruas movimentadas, caminhando pelas calçadas, decifrando as canções que tocam no meu celular. Essas horas eu queria andar de mãos dadas, bom, mas acho que chega de eu ficar implorando amor de pessoas.


Chega de depender. Pouco a pouco, estou me levantando, erguendo a cabeça e chorando. Mas chorando de raiva. Nunca fizeram tão pouco de mim como fizeram durante todos esses anos, nunca me humilharam de tal forma. E eu aceitava, aceitava que meus problemas fossem deixados de lado, que meus sonhos fossem ultrapassados pela minha suposta paixão, aceitava que eu ficasse anulado. Então, agora, levanto como se fosse a fúria física e na adaga um grito de vingança. No entanto, não sairei vingando, não sairei destruindo as vidas que me destruíram. Desejam pessoas que se envolvam, mas não façam questão de nada? Desejam um rapaz que te trata como se fosse uma garota qualquer? Então assim seja. Eu realmente amarei de novo. Eu ainda vou fazer o meu eu me amar. E aí, vocês verão o que é paz, o que é indiferença, o que é ignorância.


Os tempos de gentileza, paciência e humildade acabaram. As trevas acabaram de ressurgir no meu peito gritante como se fosse uma grande tempestade com trovões e furacões. Nos meus olhos, queimam todas as fotos, todas as canções que escutei, todos os textos que li e reli e todas as poesias que escrevi, que um dia eu sentia algo e lembrava das pessoas. Arrancaram meu coração do meu peito, e agora arranco as lembranças para terminar o trabalho mal-feito. Não existe mais gente pra voltar para casa, melhor, não existe mais casa. Eu não volto mais, não volto mais a ser quem eu era. Nunca mais. E se puder, queime as lembranças minhas também. Pois na minha cabeça, todo mundo está queimando, tudo está desaparecendo. Eu choro mais uma vez, um grito de súplica do eu romântico. Digo a ele que eles tiveram tempo o suficiente pra fazê-lo sorrir, e termino. Ele cai em terra, gritando adeus para todos. A cena acaba, eu o abraço e digo que irá ficar tudo bem. Estamos bem, sozinhos.

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