terça-feira, 19 de março de 2013

Soneto De Um Perdedor

"Hoje eu não vivo só... em paz
Hoje eu vivo em paz sozinho
Muitos passarão
Outros tantos passarinho
Muitos passarão" (O Teatro Mágico  - A Fé Solúvel)



Rascunhos feitos à mão é a única coisa que restou do meu coração. Jurei com mãos ensanguentadas de anjo, que eu faria alguém feliz. Pena que ninguém quis. Fiz de mim uma morada. Era toda suja, esquisita, perdida em lágrimas. Mas era rebocada de felicidade. Hoje em dia, está abandonada como as palavras guardadas. Vestígios da alma.


E as cláusulas provam quanto tempo levei para me entender. Sei de memórias decordas, sei de luxos revirados no meu quarto. O que eu sei é inútil. Rasgo-me, flagelo-me. O soneto do perdedor contém dezesseis anos. Tanto tempo embolado no sangue que corre em minhas veias.


Me ignoro, igualo as lágrimas internas. Onde está a luz desta caverna? Me perco em horizontes ilusórios, fazendo do meu mundo, um mundo provisório. Sinto como se estivesse correndo para o final do inferno enquanto já existem anjos no céu. Sinto como se tivesse sido deixado para trás.


Precário foi eu me menosprezar com palavras que não querem se calar. Interminável foram os dias que eu passei gritando para as paredes, rasgando meu coração como se fosse trapos, escondido no refúgio do meu quarto.


Imprevisível fora previsto. Matei um dragão com apenas uma lágrima retornável. De que adinta tentar planejar, dedicar, viajar, se não encontro um mundo para completar? De que adianta eu lutar, inventar se eu não tenho um planeta para morar? De que adianta eu estar aqui?


Apesar de tudo, fico mudo, sem escudo, faço do meu mundo algo parecido com o puro. Faço uma fogueira, sem eira nem beira, modifico as poeiras, conto as pedrinhas de areia. Grito pras nuvens, as sopro, as cato com a palma da minha mão e as jogo pra fogueira que deixei ali do lado. Me questiono se delas sairá fumaça, ou se sairá chuva. E aqui estou novamente, nesta praia deserta, de porta aberta pra quem quiser me acompanhar nesse frio trincante.


Abro o livro de baboseiras melosas que costumo carregar na mochila. Apesar de não ser totalmente verdade, parece ter pelo menos um trechinho de realidade. Gostaria de ter um coração, mas como fora citado, os trapos (restos) eu usei para fazer uma cabana para eu não passar esse frio da noite, pelo menos congelando, apenas com frio. Talvez eu consiga dormir esta noite.


Lembro-me daquela tarde como se não tivesse existido. Vi pegadas na areia, pensei que isso seria um tipo de miragem. Mas passara alguém ali, parado pra me observar e seguido em frente. Pois é, não consegui chegar a tempo para ver quem era. Mas só de conseguir me enxergar, já é uma grande coisa. Pensei em voltar pra casa, mas daí me lembrei que não tenho mais uma.


Noite fria, intermináveis horas, e alguns minutos para retomar assuntos para mim mesmo. O violão anda cheio de areia e as cordas já estão enferrujadas. Faz um bom tempo que as palavras se afugentaram do livro da música. Olho as nuvens de volta, me pergunto se chove ou não. Bem, tanto faz mesmo, pra mim, nunca fora verão.

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