sábado, 23 de fevereiro de 2013

It's Okay

"Então deixa eu cantar
Pra você dormir
E nunca mais acordar
Do sonho que eu fiz pra ti" (Fresno - Sono Profundo)



Jamais pensei que fosse escrever isso. Pensei que últimos anos poderiam ser os primeiros, pensei que meus momentos poderiam ser voltados quando quisesse, como uma máquina do tempo, no maior estilo futurístico.   Pensei que as flores na mesa jamais iriam murchar, tão rápido quanto um suspiro de conformismo, tão rápido quanto uma lágrima dolorosa. Eu lembro que você as adorava e as cuidava como se fossem suas filhas, mesmo a gente sendo incapaz de termos uma.


Tantas fotos a gente tem guardadas naquela caixa da última gaveta da nossa alma, tantas lembranças almejando voltar, tantos beijos gritando um "VOLTE!". Eu só continuo a observar nossa cama quente, que a gente se aquecia com nossos mundos recíprocos, e com todo respeito do mundo a gente tinha dois corações aquecidos com nossos sorrisos.


Saio em pleno inverno, considerando que o frio é apenas um detalhe deste inferno que vivo. Coloco meu casaco, está mesmo velho e um trapo, mas ainda cabe em mim, e foi o que eu usei quando eu te conheci. Eu lembro que você o elogiou, disse que combinava comigo. Eu lembro que fiquei envergonhado e sorri, e precisava de palavras para aquele momento?


Passo pela praça, agora tão sem-graça, coberta de neve. Aquele banco que te beijei pela primeira vez, agora está com a madeira podre, parece que vai quebrar logo. Aqueles pássaros que cantaram pra gente, pra fazer um momento romântico, agora estão dormindo. Num sono profundo e talvez nunca vão acordar. As árvores, vivas e cheias de cor, agora estão sem folhas, e apagadas num tom de cinza.


Eu faço um leve sorriso. As lágrimas já cansaram de escorrer. Elas já trabalharam demais por esses meses, semanas, não sei. Perdi a noção do tempo. As pessoas me olham com pena, com dó do pobre coitado, que provavelmente deve estar cansado. Uma moça até me parou perguntando se eu precisava de alguma coisa, eu respondi que não. A única que eu preciso mesmo, é de você de volta.


Caminho mais um pouco. Faço dos meus passos um descaso de nós dois. Costumávamos andar abraçados nesta rua vazia. Agora sou só eu e umas lembranças frias. Lembro que eu ia te buscar no trabalho, de bicicleta, e você ia na garupa, falando idiotices e eu te correspondendo como seu fiel escudeiro. Parecia que a gente dava luz para aqueles dias. Ah, época de ouro.


Dou meia-volta e volto ao portão da nossa casa. Eu lembro que a casa no início era sua, você tinha comprado com as economias que tu guardava desde a oitava série. Foi nesse portão que eu te conheci. Eu era um perdido, estava procurando meu novo apartamento, e você estava saindo pro seu primeiro dia na faculdade. Eu perguntei pra você, você sorriu, e apontou pro prédio ao lado da casa dela. Eu morei um tempo naquele apartamento, até que ficamos amigos. Saíamos juntos, eu pro meu trabalho, você pra faculdade. Eu era feliz. Mas quando eu me toquei, eu tinha notado que eu não sabia mais ficar sem você ao meu lado. Eu era um dependente de você.


Foi então que criei coragem. Respirei fundo, te intercepto antes de entrar por aquela porta. Gritei exausto, porque eu tinha corrido pelas escadas, porque eu me lembrei que você ia viajar no fim de semana. Você me olhou surpresa, e perguntou por que correr tanto. Eu falei pra ficar quieta, que eu precisava falar uma coisa importante. Então deixei meu coração falar sozinho. Todas as palavras que falei, todo sentimento que joguei na sua frente, fez tudo diferente. Você começou a chorar de alegria. Sorriu e me xingara, e logo me abraçou. Como a gente era tímido, foi demorado nosso primeiro beijo. A praça, lembra?


Só que esses anos passaram, as últimas lembranças de você no hospital me fazem eu ficar mal. Lembro de você deitada naquela maca, os médicos não me deram esperança alguma, disseram que seu problema respiratório logo iria acabar contigo. Eu chorei até meus olhos sangrarem. Eles disseram que teria que fazer uma cirurgia de risco, que as chances de sucesso eram pequenas. Eu falei que fizessem qualquer coisa pra te salvar. Queria que tivesse dado certo.


E minutos antes da cirurgia, fui te visitar. Quando te vi,me surpreendi, você sorriu mesmo naquela situação extremamente triste e delicada. Você falou o que tu me disse depois que eu me declarei pra ti. "Seu idiota, pare de me olhar desse jeito". Foi aí que eu realmente desabei. As lágrimas não paravam, o coração não parava de acelerar, e meus olhos já não conseguiam olhar pra frente. Foi aí que eles te buscaram pra tentar te salvar.


Agora estou aqui, escrevendo uma carta. Lembra que você me falou que eu era muito sentimental? Então, aqui estou escrevendo meus sentimentos, toda a minha amargura e tristeza. Se eu quisesse poderia apenas ir dormir no sono profundo, mas o tempo já está fazendo isso por mim. É triste mesmo saber que mesmo um velho sente vontade de se matar. Não, está tudo bem, querida. Logo,logo, te vejo na outra vida.

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